Mr Ynet

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terça-feira, 31 de maio de 2016

"A ilusão do saber" do profº José Antônio da Silva Barros

O saber vasto e variado que pode culminar na erudição só é adquirido através do estudo diuturno, principalmente por leituras, releituras, resiliência, análises e pesquisas exaustivas. É o que fazem os eruditos, exegetas e pesquisadores. Não pode ser comprado ou obtido por intermédio de artifícios ou expedientes escusos, mas atualmente qualquer individuo que esteja disposto a desembolsar as quantias exigidas por algumas instituições de ensino pode realizar o acalentado sono de obter um título universitário. Se todos, ou pelo menos, a maioria dos estudantes egressos dessas instituições conseguissem, efetivamente, agregar valores aos seus conhecimentos seria algo excepcional.

     A flexibilização de acesso aos cursos superiores poderia representar um grande avanço, mas, na realidade, há outras intenções ou interesses inconfessáveis por trás de tudo isso. É, sem sombra de dúvida, a mercantilização do ensino em todos os níveis. Em outras palavras, a educação tornou-se uma mercadoria como outra qualquer, e, como não poderia deixar de ser, essas famigeradas instituições acabam seguindo a lógica do mercado, que é a busca incessante pelo lucro fácil. Vale ressaltar que muitas delas fazem parte de um grande negócio que movimenta boa parte da economia. Os investimentos em educação superior ao longo dos últimos anos tem se mostrado bastante rentáveis. É um filão que vem sendo explorado cada vez mais.

     Considerados como clientes, os estudantes dessas universidades acabam sendo beneficiados pelas próprias instituições que sempre procuram meios de minimizar os índices de reprovação temendo que a clientela possa optar por uma concorrente menos exigente. Como se vê, o cliente precisa estar satisfeito. Via de regra, a responsabilidade pelo fracasso do aluno é imputada ao professor, ou seja, o freguês tem sempre razão. Com efeito, o saber produzido nos moldes do sistema capitalista pode ser vendido, trocado ou consumido. Daí a crise do ensino público que resulta em grande parte dos interesses dos empresários do setor que estão sempre impondo as regras nos bastidores da política, e portanto, não tem interesse na melhoria do ensino   oferecido pela rede pública.

     Por outro lado, a leniência, a falta de critérios mais rígidos nos processos de avaliação aliados a uma série de outros fatores tem contribuído para a formação de indivíduos que podem ser considerados como autênticos analfabetos funcionais, uma vez que são incapazes de assimilar e interpretar o significado de palavras ou expressões de textos mais sofisticados.

    Num mundo prenhe de mudanças constantes e tendo em vista que a quantidade de informações e conhecimentos aumenta de maneira incessante, um profissional pode ficar superado em pouco tempo, uma vez que o mundo moderno exige uma série de competências além dos conhecimentos específicos.

   O antigo princípio que considerava o conceito de educação (entendida como Bildung, "formação") segundo o qual o conhecimento não pode estar dissociado do espírito e do próprio individuo cai por terra A educação nos moldes atuais não resiste a esses pressupostos. Os conteúdos das disciplinas são transmitidos de maneira superficial como mera informação sem nenhuma preocupação com os aspectos conceituais afastando-se das cogitações mais profundas.

    A falta de leitura e o consequente empobrecimento da linguagem dos estudantes são preocupantes. Os alunos, por sua vez, buscam apenas o saber técnico necessário para competir no mercado. Não há a preocupação de transformar o individuo num cidadão conscientizado e politizado capaz de refletir sobre os problemas que afligem a sociedade na qual está inserido. Causa espécie ouvir de pessoas que por dever de ofício deveriam sempre estar em contato com a escrita e a leitura dizer, com todas as letras, que não gostam de ler. Uma das premissas básicas do meu modo de pensar é que quem não ler dificilmente vai aprender a pensar, que é o objetivo precípuo da educação. É preciso ter em mente que a dialética de cada um depende de seu grau de cultura.

    Ao ingressar nos meios acadêmicos, o aluno deve estar imbuído da idéia de que é uma oportunidade de abrir novos horizontes e não um atalho para galgar uma oposição privilegiada na sociedade. Gandhi já chamava a atenção para o fato de que os maiores males que padece a humanidade são: riqueza sem trabalho, prazeres sem escrúpulos, conhecimento sem sabedoria, comércio sem moral, política sem idealismo, religião sem sacrifício e crença sem humanismo.

    Em última análise, a educação que é indubitavelmente um instrumento fundamental para a mudança de uma estrutura opressora e excludente acaba se transformando numa ferramenta a serviço da manutenção do status quo pelas elites.

    Para este escriba, somente uma educação voltada para a democratização da sociedade pode formar cidadãos críticos e conscientes e não um rebanho de consumidores ávidos por produtos descartáveis que proporcionam apenas prazeres efêmeros.

Do Mairi News